Gênero literário com raízes fincadas na cultura popular brasileira, o Cordel teve como berço a Região Nordeste. Embora, desde o século XVI, romances em versos de origem portuguesa e espanhola tenham circulado pela colônia, somente em 1808, com a chegada da família real portuguesa ao Brasil e a instalação da Imprensa Régia no Rio de Janeiro, foi possível a impressão de algumas brochuras que contavam histórias tradicionais, como a da sábia Donzela Teodora, originária de um conto do Livro das Mil e Uma Noites. Histórias contadas de geração a geração, reescritas e ampliadas, passaram a compor o acervo da Literatura de Cordel graças, principalmente, à iniciativa de um poeta genial chamado Leandro Gomes de Barros, que nasceu na Paraíba em 1865, mas viveu parte de sua vida no Recife, onde veio a falecer em 1918. Leandro escreveu, entre tantas obras, História do boi misterioso, A força do amor, O cachorro dos mortos e a História da donzela Teodora.
Publicado originalmente em folhetos de tamanho variado, o Cordel aborda uma grande variedade de temas, dos contos de fadas aos romances de bravura; das pelejas (disputas reais ou inventadas) entre repentistas aos contos de gracejo ou anedóticos. Também narra, de um jeito muito especial, fatos históricos, e reconta a vida de pessoas, anônimas ou conhecidas. Exatamente como Jonas Samaúma faz na coleção Vidas em Cordel. Não é à toa que o Cordel já foi chamado, em outros tempos, de “jornal do povo”.
O Cordel é composto de muitas modalidades, sendo a mais usada a sextilha (estrofe de seis versos com rimas no segundo, quarto e sexto versos). Em seguida vem a setilha e, em menor número, a décima. Outras modalidades mais comuns ao repente aparecem em pelejas escritas (fictícias ou reais), simulando a disputa poética ao som da viola.
No Cordel, são consideradas clássicas as obras que alcançaram sucesso junto ao público, a exemplo de O Cachorro dos Mortos e Juvenal e o Dragão, de Leandro Gomes de Barros, A Chegada de Lampião no Inferno, de José Pacheco, e Proezas de João Grilo, de João Ferreira de Lima. Também são consideradas clássicas obras de excelência literária, como O Enjeitado de Orion, de Delarme Monteiro, e O Violino do Diabo, de Maria das Neves Batista Pimentel. O maior clássico e símbolo inconteste é O Pavão Misterioso, de José Camelo de Melo Resende.
Há dois grandes grupos de histórias no universo do Cordel.
O primeiro envolve os temas perenes, com histórias que dialogam com a tradição oral, a religiosidade popular e as interfaces com outros gêneros literários, incluindo livros de grande circulação no período de formação da poesia popular brasileira.
O segundo grupo abarca os noticiosos, cordéis pedagógicos, engajados, biográficos (as grandes exceções são Lampião e Padre Cícero, personagens de ciclos abrangentes oscilando entre a História e a lenda).
Recife, primeiramente, e depois as cidades paraibanas, especialmente Guarabira e Campina Grande, são os centros de produção de Cordel nos primórdios. Belém do Pará, Salvador, além de cidades pequenas da Zona da Mata nordestina e da área cacaueira da Bahia, também assistiram à difusão do Cordel, assim como o Rio de Janeiro, tendo como cenário a mítica Feira de São Cristóvão, e São Paulo, sede da Editora Luzeiro, a mais antiga em atividade no país.
Embora não seja a única técnica de ilustração utilizada para ilustrar as capas dos folhetos populares, a xilogravura é a mais característica. Grandes nomes da xilo como J. Borges, o saudoso José Cavalcante (Dila), Abraão Batista, Stênio Diniz, e os irmãos Jerônimo Soares e Marcelo Soares, além das capas dos folhetos, criaram artes para numerosas exposições. Atualmente, assim como no Cordel, tem aumentado a participação feminina, com as presenças de Nena Borges, Regina Drozina, Kelmara Castro, Nireuda e Lucélia Borges.
Grandes nomes da literatura nacional já se inspiraram na Literatura de Cordel. Os mais notórios são João Cabral de Melo Neto (Morte e Vida Severina), Cecília Meireles (Romanceiro da Inconfidência), Carlos Drummond de Andrade (O Romance de João-Joana) e Ariano Suassuna (Auto da Compadecida). No Cinema, é notável a influência do Cordel na obra de Glauber Rocha (Deus e o Diabo na Terra do Sol e O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro). Na música, podemos citar Luiz Gonzaga, Zé Ramalho, Alceu Valença e Chico César, entre outros.