Conteúdos:
A Krystina Drosdowicz
Tem história que fascina.
Ela nasceu na Polônia,
Era judia a menina.
Num tempo de escuridão,
A sua luta ilumina.
A Krystina Drosdowicz
Tem história que fascina.
Ela nasceu na Polônia,
Era judia a menina.
Num tempo de escuridão,
A sua luta ilumina.
Durante a Primeira Guerra,
Bem no meio da fronteira,
Tava tendo bombardeio
E seu pai cavou trincheira;
Nasceu então num buraco
Coberto só por madeira.
A vida de um judeu
Não tinha nenhum confete:
Aquele horror do holocausto
Eu não sei se se repete:
Ela ia pra sinagoga
Montada numa charrete.
Na família da Krystina,
Quando nasceu um menino,
Seu pai logo decretou:
“Esse será um rabino”.
Mesmo antes de falar,
Já tinha certo o destino.
Irei abrir um parêntese
Pra falar de um primo seu:
Quando ia ser fuzilado,
Apenas por ser judeu,
A mãe pulou no nazista,
E ele pra longe correu
Krystina era traquina,
Muita bagunça ela faz.
Tinha treinamento em casa
Contra as bombas de gás,
Arrancava os cabelos
Sua mãe por não ter paz.
Sendo o destaque na escola,
Muita coisa ela conquista,
Mas quando foi descoberta
Com um livro comunista,
Mudou-se então pra Varsóvia
Pra fugir da “podre lista”.
Adiantada nos estudos,
Entrou na universidade,
Mas sentava separada
Por não haver igualdade:
É porque já estava perto
De vir a calamidade.
Varsóvia bombardeada;
Ninguém dava mais um passo,
Tava trancada e fechada,
Cada qual no seu espaço.
Na tempestade de bombas,
Atingiu-a um estilhaço.
Eles compravam comida
E logo se armazenava,
Mas mesmo trancando a porta,
Essa Krystyna arrombava
E alimentava os mais pobres,
Porque a fome era brava.
O filho de um alfaiate
Com Krystyna quis noivar.
Quando pra sua família
Ela o foi apresentar,
Era tão pobre o rapaz
Que seu pai só fez chorar.
Uma loja de madeira
Ganhou pra sobreviver.
Por um preço bem barato
Começou tudo a vender,
Se chegassem os nazistas,
Nada mais iria ter.
Quando de fato chegaram,
Pra um gueto teve que ir.
Em penosas condições,
Era difícil sair,
Só se levasse no braço
Uma Estrela de Davi.
Mas o ódio não parou
Nem o olhar de cinismo.
Tinha apenas acabado
Capítulo do nazismo,
Porque ainda era crescente
O tal antissemitismo.
Pra na alma ter calor,
Sair do ódio e do frio
Para uma nova vida,
Ela mesmo se pariu:
Como muitos dos judeus,
Se mudou para o Brasil.
Não é apenas Krystyna,
É a história que nos conta:
Da inquisição ao nazismo
Sempre existe uma afronta.
O judeu tem que viver
Sempre com a mala pronta.
Seu marido a convenceu
De que o mundo estava torto;
Judeu nascer no nazismo
Era quase nascer morto.
Em condições bem precárias,
Na floresta fez aborto.
A ferida da loucura
É preciso que se estanque.
Russos tomaram a Polônia,
Em um destemido arranque.
Krystyna comemorava,
Dançava ao redor do tanque.
Se o inferno acabava
Ela não foi para o céu.
Tudo que passou Krystyna
Não cabe em nenhum cordel.
Ela ter sobrevivido
Foi o seu maior troféu.
Ia de um gueto pra outro,
Numa missão que não para
E nessa sua saída,
Oportunidade rara,
A lembrança que ela tem
É ganhar tapa na cara.
A Polônia parecia
Se transformar em vulcão.
Enviaram seu pai pra
Campo de concentração,
Já a sua mãe querida
Foi posta numa prisão.
A Krystyna, envolvida
Em uma ação guerrilheira,
Pra salvar a sua mãe,
Encontrou uma maneira:
Mandá-la pro ambulatório
Aos cuidados de enfermeira.
Guerrilheira e tão ligeira,
Na prisão chegou bem cedo,
Deu dinheiro para o médico,
Inda lhe apontou o dedo:
Ele atendeu seu pedido
E quase mijou de medo.
Mas alguns meses depois
Pro campo iria num trem:
Ela subornou os guardas
Com duas notas de cem,
E junto com a Krystyna
A mãe para o gueto vem.
Vem pra cá e vai pra lá,
Tinha missão todo dia
Porque na rua de fome
Toda hora alguém morria.
Sobreviver só de pão
Pouca gente conseguia.
A artilharia alemã
Era bastante pesada.
A guerrilha foi heroica,
Mas não era imaculada;
Então nessa rendição,
Ela foi capturada.
Estava sendo levada
Pra um campo de prisioneiros;
Aproveitou o descuido
Que baixou nos fuzileiros,
Gritou: “Fuga!” E deu no pé
Junto com seus companheiros.
Detalhe: ela estava grávida
Durante todo o combate.
Mesmo antevendo derrota,
Não jogava pelo empate.
Ter criança nesse mundo?
Era intenso o debate.
Olhar bem no olho da morte,
Conseguir ir adiante,
Se entregar para o combate
Até o último instante:
Os judeus e os poloneses
Começaram um levante.
Se existe anjo da guarda,
O de Krystyna é sargento,
Pois na hora do combate
Tinha mais bomba que vento:
Explodiram sua base,
Mas sem ela no momento.
Ela era a mensageira,
Libertava com a fala,
Caminhava por porões
Na hora que a noite cala.
Ela até se desviou
Quando lhe mandaram bala.
Judeus não acreditavam:
A fé era um espantalho
Pensavam que trabalhar
Pudesse ser um atalho;
Esvaziaram o gueto
Para os “campos de trabalho”.
Numa marcha para o trem
Parecia procissão.
Em fila o destino era:
Campo de concentração,
Mas com muita agilidade
Ela salvou seu irmão.
Lá no meio dos destroços,
Para ninguém perceber,
Conseguiu cavar buraco
Para poder se esconder.
A família ali vivia
Mal podiam se mexer.
E ligeira como sempre,
Fala pouco, sempre escuta,
Dava-se sempre um jeito
De continuar a sua luta;
Buscou pra si um cafofo:
Foi morar com prostituta.
Com um documento falso,
Findou ouvindo apito
De um oficial nazista,
Que chegou em grande agito.
Quando viu seu documento,
Era bem do seu distrito.
Mas ele não conferiu
Por ela nada esboçar.
Ela nem jogava pôquer,
Porém sabia blefar.
Ainda deu um fora nele,
Que a queria namorar.
Tinha encontros da guerrilha:
Reunião todo dia
Na casa dos guerrilheiros…
Ninguém nada percebia.
Nem mesmo os cruéis nazistas,
Que rachavam moradia.
Krystina salvou os seus
E arranjou uma morada.
Hibernavam numa cama,
Não se mexiam por nada,
Enquanto ela estocava
Um arsenal de granada.
Com uma cara tão doce
Parecia que era zen,
Mas ela roubava os mapas
Que mostravam o vai e vem,
Para que dos alemães
Se explodisse cada trem.
Olhar bem no olho da morte,
Conseguir ir adiante,
Se entregar para o combate
Até o último instante:
Os judeus e os poloneses
Começaram um levante.
Se existe anjo da guarda,
O de Krystyna é sargento,
Pois na hora do combate
Tinha mais bomba que vento:
Explodiram sua base,
Mas sem ela no momento.
Ela era a mensageira, Libertava com a fala, Caminhava por porões
Na hora que a noite cala.
Ela até se desviou
Quando lhe mandaram bala.
A artilharia alemã
Era bastante pesada.
A guerrilha foi heroica,
Mas não era imaculada;
Então nessa rendição,
Ela foi capturada.
Estava sendo levada
Pra um campo de prisioneiros;
Aproveitou o descuido
Que baixou nos fuzileiros,
Gritou: “Fuga!”
E deu no pé
Junto com seus companheiros.
Detalhe: ela estava grávida
Durante todo o combate.
Mesmo antevendo derrota,
Não jogava pelo empate.
Ter criança nesse mundo?
Era intenso o debate.
Seu marido a convenceu
De que o mundo estava torto;
Judeu nascer no nazismo
Era quase nascer morto.
Em condições bem precárias,
Na floresta fez aborto.
A ferida da loucura
É preciso que se estanque.
Russos tomaram a Polônia,
Em um destemido arranque.
Krystyna comemorava,
Dançava ao redor do tanque.
Se o inferno acabava
Ela não foi para o céu.
Tudo que passou Krystyna
Não cabe em nenhum cordel.
Ela ter sobrevivido
Foi o seu maior troféu.
Mas o ódio não parou
Nem o olhar de cinismo.
Tinha apenas acabado
Capítulo do nazismo,
Porque ainda era crescente
O tal antissemitismo.
Pra na alma ter calor,
Sair do ódio e do frio
Para uma nova vida,
Ela mesmo se pariu:
Como muitos dos judeus,
Se mudou para o Brasil.
Não é apenas Krystyna,
É a história que nos conta:
Da inquisição ao nazismo
Sempre existe uma afronta.
O judeu tem que viver
Sempre com a mala pronta.
Ficha Técnica:
Autoria: Jonas Samaúma
Curadoria: Museu da Pessoa
Xilogravura: Artur Soar
Designer da Logo: Mariana Afonso
Diagramação: Cordelaria Castro
Impressão: Gráfica e Editora Cinelândia
Revisão e Consultoria: José Santos e Marco Haurélio
Jonas Samaúma é contador de histórias, rezador, educador ambiental e escreve livros desde criança, tendo publicado 6 livros e 2 cordéis: “Ganesha” e “Lula Livre – O Dia Em Que Chico César Libertou o Brasil”. Aprendeu a arte de cordelizar na íntima convivência com seu pai José Santos e no período que morou com o mestre do cordel Manoel Inácio do Nascimento no Ciclovida, sertão do Ceará. É criador do Poetarot e Contarot de Histórias e um dos criadores do Programa Vidas Indígenas no Museu da Pessoa. Para conhecer o trabalho do autor siga o instagram @jonasamauma ou escreva para o email: jonas.samauma@gmail.com
Artur Soar é baiano nascido em Salvador, descendente direto de gravadores de pedra da Chapada Diamantina. É amante da cultura popular e além de gravador é músico, compositor, capoeira e poeta. Conheceu a arte vendo seu pai entalhando pedras ardósia, e suas aventuras com a gravura começaram nos primeiros anos em que viveu em Lençóis-BA. Integrou diversas exposições coletivas na Bahia e teve sua primeira exposição individual internacional em Brighton-UK (2019).
Participou e ganhou prêmios pelo Brasil, como o prêmio IBEMA de Gravura em Curitiba-PR (2015); exposição de 30 anos do Museu Casa da Xilogravura – Campos do Jordão-SP (2017) e o concurso de Artes Plásticas do Goethe Institut – Porto Alegre-RS (2019). O reconhecimento nacional do seu trabalho rendeu a indicação para ser professor de Xilogravura do maior e mais célebre atelier gráfico da Bahia: oficina do Museu de Arte Moderna da Bahia.
Realização
Krystyna nasceu em 15 de novembro de 1916, em Yanov, Polônia. Passou a Primeira Guerra Mundial em Varsóvia, vivendo no gueto até 1942. Após a guerra, trabalhou no Ministério da Indústria e Comércio, foi jornalista e fez mestrado em Pedagogia. Casou-se com Adam Drozdowicz e, em 1968, emigrou para o Brasil. Diferentemente de Joana d’Arc, a Heroína de França, protagonista de um cordel escrito pelo grande Delarme Monteiro da Silva, sobre a Donzela Guerreira que defendeu o seu país atendendo a um chamado divino, Krystyna sobreviveu para contar a sua extraordinária história.