Conteúdos:
Há gente que vem pra terra
Dotada de uma missão.
Ele veio marcar época
No mundo da educação;
Não só pra isso que veio,
Mas também marcar um meio,
O da comunicação.
Em 29 de maio,
O Gilberto nos deixou;
Todo mundo da cultura
Em eco triste chorou.
Que ele descanse em paz
Junto com seus ancestrais,
No colo do seu avô.
São Paulo se remendou
Mais que o próprio Frankenstein;
Juntando as coisas boas,
Como filme de Eisenstein,
Merecem até coroa.
Todos feitos da pessoa
Do Gilberto Dimenstein
Escrevo sobre um homem
Que conheci bem de perto,
Alguém que, perto da morte,
Estava era bem desperto.
Honro aqui sua memória,
Cordelizando a história
Do jornalista Gilberto.
Há gente que vem pra terra
Dotada de uma missão.
Ele veio marcar época
No mundo da educação;
Não só pra isso que veio,
Mas também marcar um meio,
O da comunicação.
De todas suas lembranças,
Aquela que vem primeiro
É da fazenda do avô,
Quando foi a um galinheiro;
Não pensou em aprontar,
Só galinhas libertar
E acabar o cativeiro.
As aves se libertando…
Ficou na mente a imagem
Que, durante muitas décadas,
No campo da aprendizagem,
Como fez com as galinhas,
Através das suas linhas,
Sempre lutou com coragem.
Essa notícia tão triste
Se confirmou verdadeira.
Mesmo com tão boa forma,
Tomou logo uma rasteira.
Ele que mudou o mundo,
Ainda tem tempo profundo
De viver de outra maneira.
Parece até que a doença
Lhe aguçou cada sentido.
Com prazeres corporais
Sentiu até o Cupido
Lhe ajudando em cada passo,
Pois dormia no abraço
Da mulher, Ana Penido.
E nos seus dias finais
Ele mesmo me falou:
Fama, prêmio e dinheiro
Pra ele pouco contou.
Quando a morte veio à porta,
Ele viu que o que importa:
As pessoas que ajudou.
Para que o espaço urbano
Possa ser uma extensão,
A cidade seja parte
E componha a educação,
Gente da rua, traficante
Todo mundo é estudante
Nesse mundo de inclusão.
São Paulo é feio que só,
Chega a dar conjuntivite,
Seja Londres, Paris, Cairo
Ou até New York City,
Todas têm característica,
Ajudou a criar a mística
De cidade do grafite.
Então chega uma noite
E ao deitar-se em sua fronha,
Uma mulher de mistérios
Lhe aparece quando sonha,
Diz com uma voz do além:
“Câncer é o que você tem!”
Mas que notícia medonha
É de família judaica,
Descendência marroquina.
Afinal o que é o mundo,
Se não só mais uma esquina?
Faz sinagoga em Belém,
Depois pra São Paulo vem,
Do seu avô essa é a sina.
Na cidade de São Paulo,
Foi que Gilberto nasceu.
O parque Ibirapuera
Era como um quintal seu
E nesse tempo de infância
Lhe impressiona exuberância:
Tanto café e museu.
E lá pela adolescência,
Contratava prostituta,
Porém ele não transava,
Fala pouco e só escuta
Pra obter ensinamento
De quem tinha sofrimento
E uma vida de labuta.
Já nos seus tempos de aluno
Era péssimo estudante,
Um causo da sua vida
Que aconteceu bem adiante:
Um livro seu foi lançar,
Claro que ia autografar
Num evento deslumbrante.
Sua mãe sentindo orgulho
Repara na professora:
“Ah, veio prestigiar?”
Ela fala: “Antes fora,
Queria saber ao certo
Se era o mesmo Gilberto
De postura arrasadora”.
Não foi ali estudando
Que aprendeu escrever.
O Machado de Assis
Ele desandou a ler.
Não viu nenhuma mesmice,
Ele leu tanta Clarice
Até seu olho doer.
Amigo de Paulo Freire,
Se encontravam pra beber,
E uma pérola com mestre
Conseguiu ele aprender:
Que pra ser bom professor,
Precisa ter muito amor
E um prazer de viver.
Temos tanta informação
Cada segundo do dia
Que mesmo a mente de um gênio,
Sem dúvida, pifaria
Deixa até barata tonta,
Por isso, Gilberto aponta:
“Era da curadoria”.
O papel do educador
É dar a desembolada,
Pois se a Terra é redonda,
Como a escola é quadrada?
Pra cidade e a escola
Ser um mesmo bate-bola,
ONG Aprendiz é formada.
Se a gente liga a TV,
Fala-se de tiro e faca,
Vão falando de tragédia,
É pior do que matraca.
Pra falar pra toda a massa,
O que é bom e o que é de graça,
Criou-se o portal Catraca.
Gilberto tinha um enorme
Orgulho de ser paulista;
Dimenstein era assim
Também como jornalista,
Mostrando o lado bom,
Revelando quem tem dom
Na Folha, de colunista.
Falava na CBN,
Tem coluna como crônica,
Na quebrada de Heliópolis
Tem uma orquestra sinfônica
Da qual foi um presidente
E a força é tão potente,
Deixa a terra mais harmônica.
Em Columbia e em Harvard
Algum tempo ele passou.
Dedicou-se mais um tanto,
Catraca Livre criou.
Foram anos pra valer,
Fizeram um dossiê
Pois Harvard o estudou.
Com conceito de excelência,
Ele foi se deparando:
Viu gênios no corredor
Ou do chão, iam brotando;
Não parece verdadeiro
Que, quando foi ao banheiro,
Viu prêmio Nobel mijando.
Quando falo do Gilberto
Em minha alma amanheço.
E lá ele montou projetos,
Pelo Brasil que tinha apreço.
Só faltou ver Afrodite,
Pois o céu não é limite,
É apenas o começo.
Querendo mudar o mundo,
Buscando algo que o motive,
Investigando política
O modo que a gente vive,
Revelando cada abismo
E dentro do jornalismo
Foi um grande detetive.
Um dos principais trabalhos
Que teve grande destaque
Foi de abuso sexual:
Meninas sofriam ataque.
Isso cresceu-lhe o horizonte,
Foi como ir para o front
De uma guerra do Iraque.
Ele ouvia certas coisas
De partir o coração,
Fingia cliente ou médico
Pra ter a informação
Das coisas que ele passou.
Menina lhe perguntou:
“Ei, moço, no céu tem pão?
Essa sua reportagem
Que ele deixou para nós
Repercutiu no mundo
De forma muito veloz,
Levou a libertação
E também teve a prisão
De abusador feroz.
Gilberto teve dois filhos
Com Âmbar, forte mulher,
E, além de fazer humanos,
Botaram projetos em pé.
ONG tem nome de ANDI
Chegou a ficar bem grande
E o seu propósito é:
Ensinar o jornalismo
Pro direito da infância,
Pois a violação desses
Acontecem com constância,
Por ser totalmente contra
É que seu projeto encontra
Uma extrema relevância.
Realização
Gilberto Dimenstein nasceu em 28 de agosto de 1956, em São Paulo. Foi escritor e jornalista, criador do portal Catraca Livre, comentarista da Rádio CBN e colunista da Folha de S. Paulo por 28 anos. Morreu em São Paulo, em 2020.