O grande Tupã

Marcelo Ferreira Alho

Marcelo narra o início da sua vida em um bairro central da cidade de Belém do Pará, em que sua infância e adolescência foram felizes. Sobre sua família, revela o grande amor por sua avó e, brevemente, fala a respeito da separação dos pais, da distância da mãe, que precisava trabalhar fora. Nos conta a respeito da sua vida profissional, atribuindo a um chamado feito pelos ''encantados'' da floresta, o seu primeiro contato com povos indígenas e que, a partir desse acontecimento, passou a atuar junto aos Guajajara, participando de trabalhos voluntários e ações sociais. Marcelo destaca a amizade que foi estabelecida com o povo Guajajara e que posteriormente passou a trabalhar na fiscalização de terras indígenas como funcionário da FUNAI. Nessa entrevista, ele nos traz um pouco de sua experiência atuando em defesa dos povos originários e da floresta, também diz sobre as dificuldades operacionais e dos perigos inerentes da função desempenhada como funcionário público. Dentre as histórias vividas pelo personagem, destaca sua atuação no combate a um grande incêndio ocorrido no Maranhão, onde ele atribui a intervenção de Tupã naquela situação dramática, que enviou uma chuva providencial para apagar as chamas que consumiam a mata. Por fim, nos conta sobre sua conexão espiritual com a floresta e da importância da preservação e da proteção dos territórios indígenas.

O Grande Tupã
Para eu começar a trabalhar com os indígenas, eu tenho certeza que os encantados fizeram esse chamado, tanto é que foi tudo muito espontâneo o que aconteceu até hoje. Eu não sabia nem como chegar e acabei chegando na terra indígena Araribóia na aldeia Zutia as duas horas da manhã. O grande guerreiro, que hoje se junta aos outros encantados, Zezico Guajajara, foi quem me recebeu e deu boas vindas a esse mundo, na verdade a minha família. A princípio fui fazer um trabalho que não tinha nenhum tipo de remuneração, mas isso pra mim pouco importou, o que tava importando na hora foi o chamado.
Minha mãe uma grande guerreira, que sempre lutou para dar de tudo do bom e do melhor para mim e meu irmão, diante das condições. Meu pai nunca foi presente. Minha avó que assumia esse lado paterno, aprendi muitas coisas com ela por ela ser mais presente, já minha mãe a gente perdeu o contato. Minha vó eu adorava, amo minha avó e acredito que ela deve estar junto aqui, minha avó era fantástica e nos contava várias histórias sobre a 2ª guerra Mundial, ela contava vária histórias.
Considero o povo Guajajara como uma família imensa, foi o primeiro povo que me acolheu, com o grande saudoso guerreiro Zezico Guajajara e foi a porta de entrada dessa grande família que são os povos originários. Eu não conhecia ninguém, cheguei lá com uma alimentação que era pra ser entregue para um movimento que ia ter lá. Era duas horas da manhã, e quando eu cheguei assim todo mundo saiu de suas casas porque achavam estranho um carro chegar de madrugada na Aldeia e todo mundo saiu, mas a pessoa que me receberia era ele e aí ele chamou uns guardiões para descarregar e guardar na escola e depois ele me chamou para jantar e conversamos bastante. Nesse dia acho que a gente só teve um cochilo porque de manhã cedo a gente já tava de pé e eu tava ansioso por aquele contato.
O trabalho de fiscalização de Terras Indígenas é um trabalho totalmente diferente do que as pessoas pensam falam e as vezes não tem muita noção do que acontece. É um trabalho muito arriscado com todos os seus fatores de risco é, são os invasores que muitas vezes já estão dentro do território e as vezes eles podem ver quando você entra e ficam monitorando. Além desses invasores tem pessoal que vai para destruir mesmo, cortando madeira, abrindo roça, plantando droga, fazendo garimpo, enfim, trazendo tudo quanto é desgraça para terra indígena. Geralmente esses elementos são pessoas muito ruins, são pessoas perigosas.
O incêndio de 2015, que foi um incêndio devastador para todas as terras Indígenas do Maranhão e outros territórios também, mas em específico aqui no Maranhão onde eu tive assim o chamado para também ajudar nesse combate a esse incêndio, e foi bem recente logo quando eu tava chegando no movimento junto como já falei, com minha família. A proporção desse incêndio já tava de um tamanho, que em salas de situações que a gente participava no final do dia pra ver o que tinha avançado e onde a gente tinha conseguido isolar, praticamente tava sendo muito pouco o retorno. No final, já não tinha mais recurso do IBAMA e de nenhuma fonte, já estava tudo esgotado,.Estava se aproximando do final do ano e muita gente já queria voltar para suas casas passar natal e reveillon e o que veio salvar todas as terras indígenas foi o grande Tupã, nosso Deus que mandou uma chuva geral e apagou esse incêndio em todas as terras indígenas do Maranhão.

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